JOÃO CLAUDINO FERNANDES
(21/06/1930, Luís Gomes – RN —- 24/04/2020, Teresina – PI)
— Em 2020 morria a face mais visível do Armazém Paraíba e da Família Claudino
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Foto: O empresário João Claudino Fernandes, que faleceu há três anos, em 24/04/2020, em Teresina.
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Daqui a seis anos, em 2029, o grupo empresarial da Família Claudino completará um século. Serão 100 anos de negócios nos diversos setores da Economia, a partir da compra e dinamização de uma loja (armarinho e mercearia) em 1929, na cidade de Luís Gomes, no Rio Grande do Norte.
Quem teve o topete para iniciar esse comércio foi seu João Claudino Sobrinho, o Joca, que seis anos depois, em 1935, retornou para seu estado natal, a Paraíba, e em Cajazeiras continuou tocando loja de venda de tecidos, chapéus, sombrinhas e miudezas em geral.
O velho Joca Claudino faleceu em 15 de junho de 1997, dez dias antes de completar 98 anos, que ocorreria dia 25 daquele mês e ano. Joca era filho de Uiraúna, pequeno município paraibano de pouco mais de 15 mil habitantes e 477 quilômetros quadrados que, além do empreendedor Joca Claudino, também deu ao Brasil políticos federais (senadores e deputados), entre os quais a ex-prefeita de São Paulo Luíza Erundina; escritores e jornalistas como José Nêumanne Pinto, Waldemar Bispo Duarte e Manuel Vieira; e artistas das Artes Plásticas como Ciro Fernandes e da música, rádio e TV como Barros de Alencar. De Uiraúna saiu também o ex-distrito Santarém, que virou município em 1994 e recebeu, em 2010, a denominação de Joca Claudino, em homenagem ao patriarca dos Claudinos.
Com a incorporação dos filhos ao negócio, foi constituída a empresa J. Claudino e Filhos. E com mais um período de inclemente seca na região, os filhos Valdecy e João Claudino Fernandes decidiram, com o consentimento do velho pai, buscar novas oportunidades de negócios em outros pontos do Nordeste. Foi aí que falaram a eles de Bacabal, um município de grande potencial de progresso, em um estado de excepcionais condições de clima e solo, o Maranhão. Não demorou muito e, com abertura em 19 de julho de 1958, 65 anos atrás, aparecia a estrela que mais brilharia na constelação empresarial da Família Claudino — o Armazém Paraíba, nome que leva logo ao seu “slogan”: “Sucesso em qualquer lugar”.
Os diferentes e positivos métodos de negociar, de vender, e a variedade de produtos atraíram milhares e milhares de clientes fiéis. Logo os negócios se iriam expandir. Em 1968, dez anos após a abertura da primeira loja no Maranhão, Teresina, a capital do Piauí, foi a escolhida como cidade-sede dos empreendimentos dos Claudinos. Outras lojas do Armazém Paraíba e diversas outras empresas dos dois irmãos e de outros familiares foram sendo abertos e se consolidando, Nordeste adentro e afora. Pouco mais de 90 anos depois, os Claudinos — só filhos de seu Joca são 16 — tornaram-se detentores de um dos maiores grupos empresariais genuinamente brasileiros e nordestinos.
Mas se empresas podem tornar-se longevas, atravessar séculos, seres humanos, não. Se o tempo não lhes cobrar o preço do retorno ao pó, a saúde, de modo abreviado, apresenta a fatura. E no dia 24 de abril de 2020, uma sexta-feira, a face mais visível do Grupo Claudino, o empresário João Claudino Fernandes, deixou de se apresentar à frente dos negócios e dos eventos. A Família Claudino comunicou a morte de João Claudino, de 89 anos (faria 90 anos dali a 58 dias, em 21 de junho de 2020). A Família preparou-se para enterrar o corpo do líder… mas cuidou de deixar sempre bem vivas as lições empresariais e de vida que ele, o mais exposto, o rosto e voz do Paraibão, deixou.
Conheci esse rosto e essa voz. João Claudino era o grande comunicador do Armazém Paraíba. No aniversário de suas lojas era ele o locutor, o apresentador, o animador de auditório. Em Caxias pelo menos, minha terra natal, Seu João Claudino punha dois caminhões com as carrocerias coladas, formando um grande palco, ali na Praça do Panteon, e dava início a um dos momentos altos da festa. A praça ficava lotada. Tanta gente que, como se diz, se se jogasse um carambolo para o alto, ele não cairia no chão, sairia correndo por sobre as cabeças erguidas do povaréu.
Aquele número de gente que apinhava a Praça do Panteon e suas imediações esperava com ânsia os eventos de aniversário da loja caxiense do Paraíba, seja pelas promoções nos produtos, seja pelos presentes que o Armazém distribuía, inclusive do alto, dos céus: um avião tipo teco-teco, com a logomarca redonda da empresa, voava por sobre a cidade, com seu ronco característico, e de lá de riba jogava bolas à farta para a molecada geral do município, que ficava de cabeça pro alto, acompanhando e monitorando a queda e deslocamento pelo ar das bolas que eram jogadas da aeronave. Era um corre-corre feliz, sem maiores riscos, pesar da queda de bolas em quintais alheios, em touceiras de unha-de-gato, nas águas do Itapecuru… Uma alegria!…
Pois bem. Já sensibilizada pelo avião, pelos carros de som rodando pelas ruas dos bairros e povoados e cidades vizinhas, a multidão se achegava ao epicentro dos festejos “paraibanos”. Tinha cantores sertanejos e outros, todos “de nome”… E tinha o “concurso de inteligência para estudantes”. Estes tinham de chegar cedo à praça e procurar logo um lugar próximo, agarrado, aos caminhões, pois na hora que João Claudino anunciasse o concurso, auxiliares se punham atentos para puxarem um determinado número de estudantes que agitavam as mãos para o alto, pedindo para serem erguidos. Durante alguns anos, eu fui um desses meninos…
Toda vez eu conseguia ser alçado ao palco, onde formava com outros uma fila horizontal de estudantes prontos para responderem às perguntas que seu João Claudino, com suas faces infladas e jeito bonachão, ia fazendo. Modéstia à parte, entrava ano e saía ano e eu era sagrado vencedor, respondendo sem errar (ou errando menos) as questões. Recordo-me de uma vez em que a última pergunta, que me daria a vitória se eu acertasse a resposta, foi: “O que é que o homem faz que Deus não faz?” Respondi: “Pecar”. João Claudino entendeu, ou fez brincadeira: “– Pescar?” O povo lá embaixo aplaudia e repetia que eu havia acertado: “ – Pecar!”. Seu João ria… e me dava o prêmio de primeiro lugar — geralmente bons rádios de pilha, outros pequenos objetos, e mais bolas com o símbolo do Armazém Paraíba.
Eu estava na escola, não me recordo direito, mas era naquele período ali entre as últimas séries do antigo Primário e as primeiras do Ginásio, hoje Ensino Fundamental. O certo é que de tantos os anos em que fui vencedor no concurso de inteligência do Armazém Paraíba que alguns coleguinhas, meninotes que nem eu, começaram a me chamar de “filho do João Claudino”. Pra quê!… Disse “o diabo” pros meninos, ameacei levar para a diretoria e até chamei pra briga — sempre se esperava uma após a aula, na saída, com meninos enticando, uns fazendo uma linha no chão de areia (“deste lado está tua mãe e deste lado, a mãe dele”, provocavam, para a gente apagar com os pés a “mãe” um do outro). Ou, então, um menino esticava o braço entre os dois brigões e mandava cuspir na mão aberta; na hora, retirava a mão e as cusparadas pegavam (e pregavam) na cara dos enfezados estudantes… e o pau torava, com os outros atiçando, gritando e jogando areia… Minutos depois tudo terminava e já no outro dia estava todo mundo de bem. De qualquer modo, “orgulhoso”, cioso de mim, nunca mais compareci ao “concurso de inteligência” comandado por seu João Claudino, ele que bem poderia ser a versão nordestina do apresentador Sílvio Santos…
Décadas depois, fui visitar o famoso Parque Nacional de Sete Cidades, acerca do qual, ainda menino, eu havia lido o livro “Roteiro das 7 Cidades”, de meu amigo jornalista e escritor Vítor Gonçalves Neto, o mais caxiense dos piauienses. Essa unidade de conservação, Sete Cidades, fica em território dos municípios piauienses de Piracuruca e Brasileira. Eu ficava hospedado em hotel de Teresina e ia às Sete Cidades todo dia por veículos destinados àquele fim. À noite, batia pernas pelo Teresina Shopping, do Grupo Claudino. Uma vez dessas, vi seu João Claudino andando despreocupado, sorrisão no rosto, cumprimentando um e outro. Não vi seguranças. Aproximei-me e entabulei conversa. Junto a ele estava um amigo, Dilso, gerente geral da maior loja do Paraíba em Imperatriz (MA), que disse a seu João ser eu um bom cliente. Seu João foi amistoso, receptivo, amigo. Relembrei para ele a história e minhas vitórias no concurso, o episódio na escola… Rimos muito. Àquela altura, as lojas já não realizavam eventos natalícios como os daqueles tempos. “O tempora!… O mores!”
Em Imperatriz, conheci desde a década de 1980 o empresário Neudson Claudino, irmão, com outros 14, de João Claudino Fernandes. Além de empreendedor de sucesso, meu amigo Neudson (com sua esposa Elza) é uma referência nos movimentos e organizações classistas, sociocomunitários e políticos. Foi presidente da Associação Comercial e Industrial de Imperatriz, do Rotary Club, de partido político, é ativista religioso católico e, bom papo, tem muitas histórias para contar…
Acho que a última interação minha com João Claudino Fernandes foi por meio do médico e companheiro de Rotary Levi Torres Madeira, cordelista de primeira e gestor de mão cheia das entidades para as quais é eleito. O maranhense Levi Madeira tem ligações fundas com Teresina, terra de sua esposa e minha amiga, a terapeuta ocupacional Eneida Lustosa. O casal mora há anos em Fortaleza (CE). Em uma oportunidade em que reencontrei o Levi, ele disse-me da amizade dele e Eneida com seu João Claudino. Levi sabia da minha história no concurso anual de seu João Claudino e disse-me que iria voltar a lembrar o empresário desse fato e de minha pessoa. Pediu-me uma lembrança para ser entregue ao seu João, um de meus livros, autografado e com dedicatória. Enviei “Dez Para Você”, livro de motivação pessoal e profissional, que escrevi e que se tornou um êxito de venda quando lançado.
Não me lembro do que me disse o Levi Madeira após o contato com Seu João Claudino. De qualquer modo, a morte hoje do grande empresário fez em mim ressurrectas lembranças de um tempo bom, agradável, sem as aflições que roem e corroem hoje a vida das pessoas e as pessoas de nossa vida.
Seu João Claudino, ninguém pode não dizer que o senhor trabalhou muito. Agora o senhor tem toda a Eternidade para descansar…
Faça isso em Paz.
EDMILSON SANCHES
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